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terça-feira, 9 de novembro de 2010

KinoCrítica: "Vigaristas"

Olá, personas!

Abrindo o espaço das crítica, começo com uma pérola cinematográfica quase desconhecida: "Vigaristas" (título "abrasileirado" de "The Brothers Bloom"), filme de trapaças do iniciante Rian Johnson.

"The Brothers Bloom" EUA, 2008 - 113min. Comédia/Drama  Direção/Roteiro: Rian Johnson  Elenco: Adrien Brody, Rachel Weisz, Mark Ruffalo, Rinko Kikuchi
À primeira vista, principalmente pelo péssimo e simplório título nacional e pela arte promocional (ao lado) sem inspiração alguma, "Vigaristas" não parece ser lá grande coisa. Tudo indica se tratar de mais um filme de golpistas, estilo "Onze Homens e um Segredo", com trapaceiros inteligentes, planos mirabolantes, reviravoltas e tiros, como qualquer outro do gênero, mas sem os galãs e o orçamento usuais. Mas o que o título e a promoção da Paris Filmes trazem de simples, o filme tem de complexidade.

Na trama, temos Stephen (o competente Mark Ruffalo) e Bloom (o ganhador do Oscar® Adrien Brody), irmãos na linha de Tom Sawyer e Huck Finn quando crianças, trapaceiros profissionais (surpresa!) na idade adulta que, excluídos da sociedade, vivem viajando pelo mundo, assumindo diferentes identidades, aplicando golpes nos outros, com a ajuda da enigmática e perigosa Bang Bang (Rinko Kikuchi), como meio de vida. Só que, diferente da maioria dos golpistas que vemos nos filmes, os irmãos Bloom têm uma "ética de trabalho": da mesma forma que eles se beneficiam monetariamente com os golpes, suas vítimas... bom, não são bem vítimas, já que saem pessoas melhores e mais realizadas depois da experiência. Enquanto essa é a vida perfeita paraStephenBloom está desiludido, sem saber quem realmente é, sendo apenas um personagem nas histórias escritas pelo irmão. É aí que entra em cena Penelope (outra ganhadora do Oscar®, Rachel Weisz), uma excêntrica milionária anti-social que viveu enclausurada em sua mansão a vida inteira, que vira alvo do último golpe dos irmãos antes de Bloom se aposentar, em uma aventura alucinante onde nada é o que parece.

O diretor americano independente Rian Johnson, em sua segunda incursão no mercado de longa-metragens, após ganhar o prêmio de Visão Original no Festival de Sundance pelo excelente "A Ponta de um Crime" ("Brick"), consegue dar um novo ar para um gênero já explorado ao excesso. Enquanto esse tipo de filme procura desenvolver situações inusitadas, reviravoltas (ou assim tenta), Johnson vai em outra direção: foca na narrativa emocional de seus personagens, bizarros, complexos e bem desenvolvidos (raros em filmes de trapaça), amarrada a um roteiro impecável, com diálogos inteligentes e afiados. O que está em jogo aqui não é a ação, ou o desenrolar dos intricados planos do golpista. Eles estão presentes, com reviravoltas surpreendentes também, mas são apenas ferramentas para o desenvolvimento dos conflitos internos dos personagens. Tanto que algumas situações ficam sem explicação, como um golpe que só vemos o resultado, sem ver a execução, ou mesmo a natureza dos irmãos com um dos maiores antagonistas, que fica só implícita, o que pode incomodar alguns. Mas é como eu disse, os eventos não importam tanto quanto o efeito que eles têm nos personagens e em suas narrativas próprias.

Apesar de um filme de alta complexidade, é na simplicidade que Johnson atinge sua qualidade. É uma obra de sensação, de emoções, mais do que dequebrar a cabeça para conseguir achar seu sentido, sua resolução. Ele encontrou um equilíbrio de situações dramáticas estranhamente cômicas, que vão desde o "pastelão" a um humor britânico sofisticado, hora filme de trapaças, com aventura e ação, hora filme romântico, hora drama existencial. Um prato cheio para qualquer espectador, com opções para todos os gostos.

Os aspectos técnicos também impressionam. A música "jazzística" empolga, dando ar dos grandes filmes de golpe dos anos 70, constantemente homenageados aqui, e a fotografia é deslumbrante, com cores vivas e vibrantes, que vão mudando de tom de acordo com o teor dramático do filme, cheio de simbolismos, principalmente pela direção de Johnson, que transmite mais pela imagem do que pela própria história, o que dá uma dimensão de grandiosidade enorme à obra.

Rian Johnson acertou em cheio em "Vigaristas".  Pegar tantos elementos complexos, dar coesão e conduzir tudo dando atenção a tantos detalhes com tamanha maestria é digno de aplauso, principalmente considerando que ele ainda está em início de carreira. Alguns críticos comparam o estilo dele com o de Wes Anderson, e de outros diretores mais alternativos. Eu prefiro ficar nos méritos de Johnson, cujo surrealismo está presente na obra, mas contido à história, e não conduzindo-a. Sem falar na originalidade que ele traz para temas banais, como já demonstrou em "A Ponta de um Crime". Destaque também para as atuações de Adrien Brody, que apesar de repetir seu tipo "estranho e melancólico" de quase sempre, está excelente no papel do personagem que conduz a história, cheio de conflitos internos, e, especialmente, para Rachel Weisz, normalmente em papéis dramáticos, que interpreta a personagem mais complexa, engraçada, estranha e original, na medida certa entre realidade e exagero, que merecia um maior reconhecimento por essa atuação cheia de nuances.

Um filme completo, meu "favorito atual" (tenho muitos favoritos, esse só é o mais recente).

É isso. Até mais, galera!

Crítica publicada originalmente no Jornalistando.com

Um comentário:

Anônimo disse...

Não saio de casa sem antes ler suas críticas.
Há muito tempo esperava ler conteúdo na área cinematográfica, um olhar novo, reciclado.

Parabéns!